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Septo desviado – cirurgia

Sempre respirei mal. Nunca liguei muito porque para mim era uma coisa normal. No entanto, nos últimos anos, cada vez que me constipava desenvolvia uma infecção , tipo sinusite mas que não era bem, e passava semanas e até meses doente de cada vez. À conta disso já nem sei quantos antibióticos tive de tomar nos últimos dois anos.

A minha sogra sugeriu-me que fosse fazer um TAC ao nariz para ver se haveria alguma razão física para o problema, e foi assim que descobri que tinha um grande desvio do septo.

Fui à consulta de otorrino no hospital, onde a médica me disse também que para além disso tinha também os cornetos muito grandes. Sugeriu logo que num caso como o meu, o ideal é cirurgia, mas como não gostam de dar logo esse passo drástico, tentámos primeiro tratamento através de medicação.

Fiz uma vacina oral e um spray nasal, para além de lavagens constantes com spray de água salgada.

Como esperado, o resultado foi mínimo. A única alteração que notei foi que, graças à vacina oral não me constipei tantas vezes, mas quando adoeci inevitavelmente, lá voltou a infecção.

Na consulta seguinte avançámos então para a marcação da cirurgia. Isto foi no início de Dezembro de 2017. Ligaram-me a marcar a cirurgia a meio de Fevereiro.

Depois de mais uma série de telefonemas para marcar a data da consulta de anestesia, sempre para o dia seguinte e ao fim do dia. Da primeira vez o Pedro estava em viagem portanto não podia ser. Da segunda vez não cheguei ao telefone a tempo e não dava para ligar de volta. Na terceira chamada já estava preparada e já tinha avisado os meus pais que se calhar tinham de ficar com os miúdos um dia com pouco antecedência, portanto pude dizer que sim. Lá fui eu, então, numa quinta feira.

Tanto a consulta como a cirurgia, foram efectuadas no serviço de Cirurgia de Ambulatório do Hospital Garcia de Horta. É uma secção com obras recentes e não estava à espera que aquilo fosse tão hi-tech. Toquei à campainha porque não havia outra forma de abrir as portas de correr e não aconteceu nada. Pedi ajuda a umas pessoas que passavam e disseram-me que tinha de ficar em frente à câmara para abrirem a porta. Ok… só faltava um identificador de retina.
Estive na sala de espera uma meia hora até ser a minha vez. Era a última pessoa desse dia. Pelo meio iam saindo pessoas da zona da cirurgia, em cadeiras de rodas, que levavam atrás os acompanhantes que esperavam comigo, até restar só eu.

Primeiro preenchi um formulário, depois falei com uma enfermeira. Não tenho nenhum problema de saúde grave portanto a conversa foi breve.

A única excepção foi a tensão arterial que estava bastante mais alta do que é costume para mim, nos 15/9. Percebi que isso era a minha ansiedade em acção, não por causa da cirurgia mas porque soube que o Tiago tinha sido perseguido e agredido na escola nesse dia e isso estava a afectar-me ainda. Acabei por fazer uma participação do Bully que andou a torturar o meu filho mas a coisa estava ainda muito fresca nesse dia. Falámos da questão da ansiedade mas o que a enfermeira queria saber era se eu ia ter um ataque de pânico no dia da cirurgia. Garanti-lhe que não e que nem sequer estava preocupada. Uns dias mais tarde, depois de me acalmar do drama todo com o Tiago, voltei a medir a tensão arterial e tinha voltado ao normal.

Depois de falar com a enfermeira passei para a sala do lado para a consulta com o anestesista que fez duas ou três perguntas, pediu-me para inclinar a cabeça para trás e abrir a boca, e disse-me que estava aprovada para cirurgia e podia ir embora.

A cirurgia estava marcada para dia 17 de Março mas na semana depois da consulta ligaram a pedir se podia ser logo na próxima segunda feira. Ainda hesitei porque era a semana do aniversário do Tiago e estava com receio de não conseguir fazer as preparações necessárias logo a seguir à cirurgia, mas o medo de me constipar durante as semanas seguintes e ter de cancelar a cirurgia falou mais alto e disse que sim.

No dia 5 de Março, cerca de um ano depois de ter feito o TAC, fui ao hospital para ser operada. Estava uma tempestade enorme nesse dia. Não havia barcos no Tejo e o trânsito na ponte foi interrompido por causa do vento. Havia um trânsito absurdo por todo o lado. Graças a isso os médicos chegaram atrasados e a primeira cirurgia da manhã, que devia ter começado às 9 da manhã, estava a decorrer quando cheguei ao hospital às 11.00h.

Uma amiga do meu pai que trabalha no hospital foi muito simpática e, sabendo que havia atraso, foi ter comigo e deixou-me ficar um bocado na sua sala de trabalho. Sentei-me a ler o meu Kindle enquanto ela trabalhava no computador até ligarem a dizer que eu podia ir.

Pouco depois do meio dia entrei para o vestiário para me despir e vestir a já familiar bata do hospital com os atilhos nas costas.

A pior parte destas situações, para mim, é não poder usar nem os óculos nem as lentes de contacto. O mundo torna-se uma massa colorida mas desfocada. É particularmente complicado reconhecer pessoas ou perceber as suas expressões faciais, o que torna o contacto humano difícil de navegar, como quando a enfermeira da consulta da semana anterior veio espreitar à sala e pela conversa eu percebi que devia saber quem ela era.

Sentaram-me numa cadeira reclinada para os exames de pré operatório – temperatura, tensão arterial (que desta vez estava normal), perguntas de rotina e finalmente, colocar o soro, que é a parte mais desagradável. Mesmo assim, a colocação do meu soro não me fez tanta impressão como a mesma coisa a ser feita ao senhor que estava ao meu lado. A conversa da enfermeira sobre veias que rebentam e ter de picar outra vez estava a dar-me vontade de trepar pela parede.
Fora isso devo dizer que as pessoas com quem contactei durante este processo foram todas muito simpáticas e prestáveis.

Ainda esperei quase duas horas até ir finalmente para o bloco operatório.

A maca era incrivelmente estreita e por isso prenderam-me os braços ao lado do corpo com o lençol, para não caírem quando eu adormecesse.

Começaram a injectar a anestesia e de início não senti nada. Depois comecei com comichão por baixo do nariz. A certa altura comecei a sentir os efeitos. Mantive os olhos abertos e ia respirando o oxigénio da máscara que tinham colocado por cima da minha cara, até apagar completamente.

Quando acordei, estava já noutra sala. Sentia-me ligeiramente enjoada e tinha a boca ultra seca porque o nariz estava tapado com tampões de algodão e tinha de respirar pela boca.

Acho que se calhar já tinha aberto os olhos antes mas não me lembro. Só digo isto porque a minha primeira memória é alguém a dizer-me que tinha consulta na próxima quarta-feira. Se estavam a falar comigo só posso crer que tinham razão para achar que eu estava acordada.

Deram-me medicação para o enjoo, pelo soro, e ainda estive ali um bocado de olhos fechados, porque quando os abria parecia que ficava pior. Depois de ouvir o que as enfermeiras diziam aos outros pacientes, como por exemplo que não deviam tentar ler nem fazer nada que requeresse demasiada concentração no primeiro dia, concluí que o problema era a minha visão desfocada. Estava a fazer esforço inútil para ver e isso piorava os sintomas. Pedi que me fossem buscar os óculos ao cacifo e daí para a frente senti-me melhor.

Ainda tive de esperar um longo bocado até me deixarem levantar da cama. Dei uns passos algo vacilantes até chegar a uma cadeira onde tive de esperar mais umas duas horas antes de poder ir para casa. Nunca os ponteiros do relógio andaram tão devagar como nesse tempo de espera sem nada para fazer. Fui novamente a última pessoa a sair. Já eram sete e meia da tarde e o serviço estava quase a fechar.

O Pedro chegou finalmente com uma cadeira de rodas (teve de andar às voltas até descobrir onde é que se iam buscar as cadeiras) e lá me deixaram vestir e ir para casa. Levava comigo um saco de comprimidos com tudo muito bem explicadinho. Também me disseram que não podia comer comida quente e no primeiro dia tinha de fazer dieta líquida.

Pela quantidade e frequência dos comprimidos, estava à espera de ter imensas dores. Afinal não. Aliás, não tomei nem metade dos comprimidos porque não senti necessidade. Tive algumas dores de cabeça mas no nariz não senti nada de especial. O mais irritante foi mesmo não conseguir respirar.

Aquilo que gostei mais foi quando me disseram para não assinar nada nesse dia porque podia não me lembrar depois.

Quando me vi ao espelho pela primeira vez tive imensa vontade de rir. Parecia um porquinho.

Disseram-me para não fazer esforços nem baixar a cabeça por isso estive quietinha os primeiros dois dias. Estava cansada por não conseguir respirar e acho que também ainda devido aos efeitos da anestesia.

Na quarta-feira fui à consulta tirar os tampões do nariz. Devido a uma cirurgia de urgência estive duas horas à espera, desejosa de tirar aquilo.

O tamanho dos tampões foi uma surpresa curiosa. Eram muito mais compridos do que eu pensava mas não custou a retirar. Pensei que pudesse doer por terem crostas agarradas, mas não me posso queixar. Isso é, porém, apenas a minha opinião pessoal.

O médico assistente que estava na sala connosco fez um comentário tipo “pois, parece que isso só dói aos homens”. Achei curioso mas não perguntei (até porque tinha uma médica com uma pinça enfiada na minha narina e não era boa altura para falar). Mais tarde, quando saí do hospital, o senhor que foi à consulta mesmo antes de mim veio dizer-me que tirar os tampões lhe tinha custado mais do que a cirurgia.

Em teoria, a partir daqui, já podia respirar pelo nariz. Infelizmente, como o nariz estava todo em ferido por dentro, forma constantemente coágulos enormes e crostas que bloqueiam a passagem do ar, portanto não melhorou muito. Como ainda por cima não me podia assoar para não fazer aquilo sangrar mais, continuou a ser uma recuperação desagradável, semelhante a ter uma bruta constipação ou um herpes que deixou o interior do nariz todo ferido. O gelo ajuda

Comecei, no entanto, a conseguir fazer algumas coisas mais normais como alguns dos meus trabalhos de wire wrapping, o que pelo menos ajudou a passar o tempo e cortar o tédio.

Já voltei à consulta entretanto, para tirar alguns desses coágulos e crostas. O alívio que senti quando ela tirou uma coisa do tamanho de uma azeitona da minha narina direita foi indescritível. E fiquei bastante impressionada com o jeitinho e o cuidado da minha médica de quem só tenho coisas boas a dizer.

Depois da consulta já me posso assoar, o que ajuda. Tenho só de ter cuidado para não abanar o nariz porque o osso ainda não está sólido.

Também já posso martelar – algo essencial para o meu trabalho – mas ainda não posso fazer exercício. Ou seja, nada que faça dilatar os vasos sanguíneos. Há alturas em que sinto o nariz a ficar quente pelo que continuo com o gelo.

A parte mais complicada, desde o início, tem sido dormir. Durmo sentada mas mesmo assim o nariz entope rapidamente e passo a noite a acordar, a ressonar, a ter pesadelos e acordo com o pescoço num estado lastimoso.

Enfim, a recuperação requer muita paciência e é cansativa mas pelo menos não é dolorosa portanto não me posso queixar muito.

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