Blog

Crise de meia idade

Recentemente, e pela primeira vez na minha vida, tive a clara noção de estar a envelhecer.

Até agora isso era algo que não me preocupava, em que nem sequer pensava, mas o inicio deste ano tem sido passado entre consultas, análises, exames e uma constipação que passou a sinusite e nunca mais desaparece (podia tomar antibiótico de uma vez por todas, mas onde está o desafio nisso!). Eu sempre fui uma pessoa saudável, apesar da talassemia, mas nos últimos tempos passei a ter dores constantes nas diversas articulações, questões hormonais, já vejo mal ao perto etc. Nada disso, só por si, é problemático ou me fazia sentir particularmente diferente. É uma chatice, mas é a vida.

Ontem, porém, andei a vasculhar as fotos antigas, desde que o Tiago nasceu. O meu filhote está quase a fazer 10 anos, está no quarto ano e a professora pediu para os pais recolherem algumas fotos significativas do percurso dos nossos filhos até aqui, para um projecto de fim de ano.

Olhei para umas fotos minhas com o Tiago bebé ao colo e de repente atingiu-me o quão mais nova estava na altura. Não só nova mas também com um olhar mais luminoso, um ar muito menos cansado e derrotado do que aquele que vejo no espelho e nas fotos hoje em dia.

Isto aconteceu logo um dia depois de uma consulta no hospital em que o médico repetiu diversas vezes frases como “isto é bastante comum em mulheres pré-menopausa”. Pois.

De repente senti-me muito velhinha e enrugada, o que é completamente absurdo porque nem tenho quase rugas nenhumas, mas é mais um estado de espírito. Aquilo que estou é um bocado gorducha e muito, muito cansada, mas ambas as coisas se resolvem com força de vontade (para fazer dieta) e algum dinheiro (para a mensalidade do ginásio e umas férias nas Bahamas).

Aquilo que sei é que aquelas mulheres que acham que a vida acabou quando fazem 30 anos precisam de uns estalos na cara. Não é a idade que nos define mas sim a forma como nos sentimos e aos 30 somos uns bebés. Eu percebo que essa reacção está relacionada com a vontade de ter filhos e o facto do risco aumentar a partir dos 35, mas depois espalha-se a áreas que não fazem sentido nenhum, como se uma pessoa que não tem a vida toda alinhada aos 30 fosse um falhado. Como uma mulher com 43 anos que ainda não sabe bem o que quer ser quando crescer (ou já sabe mas ainda não conseguiu chegar lá), e que por vezes ainda não se sente inteiramente adulta, acho que também não é preciso ser tão rígido nessas coisas.

Mas a verdade é que sinto que passei os últimos dez anos com os meus filhos como o centro do universo e que eu, de certa forma desapareci, o que explica esta estranheza em relação ao passar do tempo. A rotina não ajuda. Não há grandes diferenças entre dias de semana, fins de semana e “férias”.

O que eu fantasio com férias! Com poder passar duas semanas num sítio onde as únicas coisas que tenho para fazer são dormir até ao meio dia, tomar banhos de espuma enquanto leio um livro e beber chazinho num sítio com uma vista fantástica. E dizer isto sabendo que estou em casa, sem ter de ir trabalhar para um escritório o dia inteiro como a maioria das outras mães, parece altamente injusto e egoísta, mas a verdade é que há SEMPRE coisas para fazer. Especialmente quando se tem um marido que ocasionalmente tem de ir viver para outro país 3 semanas por mês, e uma mulher a dias que se foi embora em licença de parto e com sorte voltará daqui a uns 8 ou 9 meses.

Estou a tirar o meu segundo curso e tenho um projecto para o percurso que quero seguir, mas a verdade é que é preciso trabalhar muito e ter muita sorte para obter algum sucesso em qualquer área, especialmente quando estamos por conta própria. E há a luta constante entre o que quero fazer e o que tenho de fazer, as tarefas relacionadas com o negócio e as tarefas domésticas.

As minhas avós eram donas de casa e raramente estavam quietinhas sentadas no sofá a ver novelas. Isso era um bocadinho à noite, antes da caminha. O resto do dia era andar de um lado para o outro a arrumar, limpar, coser, cozinhar e uma lista infindável de tarefas, e quando se está em casa, lá estão essas tarefas todas à nossa espera, constantemente. Em cima disso, hoje em dia as mulheres que não se sustentam financeiramente sofrem de uma grande dose de sentimentos de culpa e fracasso. Eu sei porque sinto isso muitas vezes e se pudesse voltar atrás provavelmente teria feito as coisas de maneira diferente. Mas por outro lado sei que pelo menos estou presente para os meus filhos, coisa que a minha mãe nunca pode fazer porque trabalhava dias, noites e fins de semana, e eu vivi durante muitos anos em casa da minha avó graças a isso. Hoje os avós trabalham por isso não sei como é que as mães se safam, sinceramente. Só mesmo com crianças no ATL das 8 da manhã às 8 da noite, e mesmo assim acredito que seja apertado.

Ou seja, no meio da luta para fazer alguma coisa que dê sentido à minha vida, ando há 10 anos a lavar pilhas infinitas de roupa, a tratar de chatices, a transportar coisas pesadas (crianças, sacos, mochilas, etc) ao ponto de ter desenvolvido uma tendinite no cotovelo e a sofrer mais pelos filhos do que pelo que me acontece a mim.

Isso é uma coisa para a qual não estava preparada. Sabia que ter crianças dava trabalho e lixava o sono mas não sabia que ia sofrer tanto por/com eles. Não pelos joelhos esfolados e essas coisas mas pelos momentos em que não posso estar lá, pelas coisas em que não posso ajudar – as bestinhas que lhes batem na escola e que me dão vontade de fazer uma espera à saída e desfazê-los à pancada (a eles e aos pais), os ataques de pânico causados pelo estudo de um programa completamente inadequado à idade, instituído por um ministro da educação que devia ser preso pelo estrago que fez a uma geração inteira de crianças deste país, coisas assim. Sofro verdadeiramente com isso tudo e não sei o que fazer. Tira-me o sono, revolta-me e faz-me sentir absolutamente inútil perante algo que não tenho a capacidade de resolver.

Mas isto faz-me perceber que estou demasiado envolvida na vida deles e que a minha vai ficando para trás. O tempo vai passando e não faço as coisas que gosto, não cumpro os planos para mim própria e um dia destes vai ser tarde demais. Mas como é que se mudam estes hábitos? Também não sei bem. Os homens compram um descapotável. As mulheres fazem o quê?

Rant escrito às 5 da manhã porque já não valia a pena fazer de conta que estava a dormir.

Veja também...

2 Comments

  1. Ana Cristina says:

    De forma diferente, por motivos diferentes mas com resultados iguais, também deixei escapar 10 anos de mim. Sei tão bem o que isso é… consegui mudar parte disso só aos 48. Ainda fui a tempo mas demorou muito a conquistar essa mudança. Mas cheguei à conclusão que se não estivermos bem, isso reflete-se tb na familia e no trabalho ou projectos pessoais. E torna-se uma bola de neve.
    A principio parece- nos uma atitude um pouco egoista defenirmos tempo e prioridades para nós, mas acredita que muda muita coisa.
    Fiz 50 em Novembro, sinto-me melhor, mais bonita, mais confiante nos negócios, mais paciente para a familia, com mais energia e mais nova do que me sentia aos 42… 🙂
    Esse click que tiveste é o inicio, vais encontrar o caminho para a mudança necessária.

    1. Obrigada. De facto o mais difícil é acharmos que merecemos o esforço e o investimento, mas espero chegar lá 🙂 Beijinhos.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.