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Depressão pós-hospital

Na segunda feira de manhã começou a ronda diária de médicos e enfermeiras a entrar e a sair da sala. Foi uma manhã longa com a impaciencia de falar com o Pedro que só pode ir finalmente ver o filho ao meio dia. Das 3 às 4 da tarde tive uma série de visitas a entrar e a sair em intervalos de 5 ou 10 minutos. Depois fiquei sozinha novamente até às oito da noite.

A senhora da cama ao lado saiu às sete e ainda pensei que fosse ficar sozinha no quarto essa noite mas pouco depois trouxeram outra. Era uma senhora simpática, que tinha tido uma menina e com quem ainda me fartei de falar durante os quatro dias que fui obrigada a passar no hospital.

Neste segundo dia o Tiago abriu finalmente os olhinhos. Nunca pensei que uma coisa tão simples pudesse ser tão emocionante. É incrivel como uma pessoa fica completamente estupidificada com estas coisas mas suponho que é assim mesmo. Os instintos são muito fortes.

Essa noite começou o stress porque o Tiago recusava-se a mamar. Nem sozinha nem com a ajuda das enfermeiras conseguia que ele pegasse na mama e só via as horas a passar. As enfermeiras iam mudando e cada uma tentava a sua técnica. Foram-lhe fazendo picadas para ver o nível de glicémia e só ao fim de 36 horas é que consegui finalmente que ele mamasse por uns cinco minutinhos. Daí para a frente foi sempre o mesmo stress a cada 2 ou 3 horas já que ele não tinha sequer o reflexo de busca e recusava-se a acordar.
A terceira noite foi a pior porque assim que começou finalmente a mamar o Tiago passou a noite a chorar com dor de barriga. Entre as 3 e as 5 da manhã não parou de chorar. Chamei uma enfermeira mas calhou-me uma toda arrogante que não me ligou nenhuma. Quando finalmente apareceu outra veio com uma tanga qualquer de que os bebés às vezes choram sem razão, bla, bla, bla. E quando eu tive a lata de chamar colicas ao que ele tinha ainda cheguei a ouvir uns comentários tipo ‘pois, isso das cólicas é desculpa para muita coisa.’ Tradução: a tipa não sabe o que está a fazer e é facil dizer que a culpa é das cólicas. A verdade é que ele não mamava porque estava com dores na barriga e não havia grande coisa que eu pudesse fazer.

De manhã ele acalmou finalmente e eu adormeci. O que acho fabuloso é que gozaram comigo por estar a dormir, como se fosse quase um crime. É impossivel descansar no hospital. De noite são os bebés a chorar e pessoas a andar no corredor, de dia é isso acrescido das visitas de 20 em 20 minutos para medir a tensão, distribuir medicamentos, trazer comida, examinar as mães e os bebés, fazer inquéritos, etc. Porque é que não juntam pelo menos algumas dessas coisas numa só visita? É assim tão complicado medir a tensão e deixar comprimidos de uma só vez?

Pelo menos fiquei a saber que o problema dos pés não é grave e é uma questão de fazer ginastica para fortalecer os músculos. Por outro lado fez um rastreio auditivo que só passou do lado esquerdo. Acho que foi simplesmente porque quando foram ver do lado direito ele estava a mastigar e isso interfere com o mecanismo do teste. Mas não deixa de ser mais uma dúvida para o futuro. Ficou marcada uma nova consulta para daqui a seis meses.

A partir daqui o cansaço começou a aumentar e a vontade de ir para casa triplicou. Comecei a ter fantasias de prison break. Nem seria muito complicado – tinha roupa na mala e o alarme do Tiago saltava cada vez que ele abanava o pé (pois, porque eles agora metem alarmes nos bebés que apitam se se tentar sair com eles do hospital).

Na quarta feira tive mais uma má notícia – ele estava muito amarelo. Fizeram-lhe uma análise e às 4 da tarde disseram-me que estava com ictericia e precisava de ser posto debaixo de uma lampada de ultra-violeta durante pelo menos 24 horas. Comcei a ver a alta do dia seguinte a esvair-se em fumo.

Fiquei então com um bebé num aquário durante quase dois dias. Só o podia tirar para comer, algo que demorava uma hora de cada vez porque ele não queria acordar. Pelo menos parecia satisfeito todo esticado no quentinho, como se estivesse na praia a apanhar sol.

O último dia no hospital foi uma tortura. Continuaram as dificuldades em alimentá-lo e a ansiedade de saber se ainda tinha de passar outra noite ali. Acabei por ir chorar umas quantas vezes para a casa de banho, de pura exaustão e inicio de desespero. Há quatro dias que não via a luz do sol e estava sozinha a tomar conta de um bebé pela primeira vez sem ajuda nem ninguém com quem desabafar sequer, rodeada de pessoas desconhecidas, umas simpáticas outras super brutas. Acho que cheguei mesmo muito perto dos meus limites neste dia.

Tiraram novamente sangue ao Tigar às 5 da tarde e disseram que a analise demorava cerca de uma hora. Como a hora normal de alta é às sete achei que já faltava pouco. Afinal às nove da noite ainda lá estava, à espera dos resultados. Já tinha perdido a esperança de ir para casa quando finalmente apareceu o pediatra com o resultado da analise e finalmente nos deixaram ir embora. Foi um daqueles momentos de aivio puro. Senti-me como se me tivessem deixado sair da prisão depois de ter sido falsamente acusada de matar alguém.

Só sei que passei a compreender as pessoas que vão para hospitais particulares. No HGO podem ser muito bons tecnicamente mas as pessoas são um bocado tratadas como gado.

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7 Comments

  1. Olá mais uma vez! Tens razão, o HGO é bastante bom mas a nível de relações humanas fica aquém do que seria de esperar. Também lá tive os meus filhos e senti-me um pouco “abandonada”. Concordo ainda contigo acerca das rotinas hospitalares…realmente podiam “resumir” algumas das visitas que fazem às mães e bebés…no meu caso tive a sensação de que, sempre que tentava adormecer, alguém vinha fazer de propósito para me despertar. Quanto ao Tiago estar com dificuldades em se alimentar, acho que é normal…afinal ele ainda pensa que está na barriguinha, sem trabalho nenhum! Daqui a uns dias os reflexos aumentam e ele passa é a não querer outra coisa senão a maminha!
    Bjs e Felicidades!

  2. Cecilia says:

    Olá. Antes de tudo o mais, muitos parabens e muitas felicidades para toda a familia. Fiquei muito contente que tudo tenha corrido bem. Faz muito tempo que leio o seu blog pois vivi uma situação parecida com a sua e tambem perdi o meu bebe quase no final da gravidez. Neste momento já tenho uma filhota linda que fará 6 anos no proximo mês. Revejo-me completamente em quase tudo o escreve. Sei que se deve sentir muito ansiosa mas gostaria de partilhar consigo a minha historia. A minha filha tambem nao mamava e acabei por nao conseguir dar peito pois todos os esforços foram infrutiferos. Até comprei mamilos de silicone pois são mais finos e poderia resultar. Mas nao resultou e 3 dias após ela ter nascido, e contra tudo e contra todos, exigi um biberon na maternidade e tudo correu bem. Ela começou a comer, deixou de estar prostrada e sempre foi uma bebe saudável. É claro que nunca mais pegou no peito mas paciencia. Tambem ela não passou no teste de audição do ouvido direito. No entanto voltei à maternidade 1 semana apos o parto e já estava tudo normal. A explicação que me deram é que podem ficar impurezas do liquido amniotico e depois fica tudo bem. E de facto ficou. No entanto nao esqueço o que me disse o pediatra na altura: Mãe, a sua filha nunca será surda pois ouve de um ouvido. Quanto muito poderá ouvir mal.
    E finalmente tambem a minha filha teve ictericia e nao tem nenhuma sequela disso. Tudo isto para lhe pedir que relaxe, e usufrua, usufrua muito desse ser maravilhoso que tanto custou a chegar e que vai mudar toda a vossa vida. Uma vez mais parabens. Cumprimentos

  3. Ana Paula Miraldo says:

    Dee, como a tua descrição me soa familiar: o stress de não mamar, o desinteresse das enfermeiras que só me ligaram qd o leite desceu e encaraçou, o estar a cuidar de uma criança sozinha depois de ter feito uma cesariana, eles choram, nós com dores, sem tempo para recuperar, nem para dormir. Em casa, as coisas melhoram um pouco. No meu caso, o meu nunca chegou a mamar, ninguém conseguiu e qd uma enfermeira bruta me viu perto de descambar numa depressão pós-parto, num choro convulsivo, aí prestou atenção e foi mais cuidadosa. Pediu-se medicação ao médico e secou o leite. Vais ver que com a ajuda do Pedro, as coisas melhoram. Qt às cólicas, alguns conselhos de alguém cujo filho teve cólicas até mt tarde pq cada vez que lhe nascia um dente, lá ficava ele com cólicas. O Chá de funcho da Milupa ajuda, compras no hipermercado, vais-lhe dando aos bocadinhos em vez de água, segui sempre o conselho da minha mãe, dar água ao bébé pq se nós temos sede, eles tb. Massajar a barriguinha dele no sent dos ponteiros do relógio, dando leves pancadinhas em torno da zona do umbigo. Colocá-lo de barringa para baixo no teu braço e massajar a barriguinha tb ajuda. Se ele tiver mts cólicas, é mt importante que lhe dês de mamar tipo 5 min e o coloques a arrotar. Como o meu tinha mts, de 50 em 50 ml de leite, tinha de o colocar a arrotar e isso ajudou mt. Não me lembro de mais nada. O me pimpolho vai fazer este ano 3 anos. Feel free to e-mail me if you want. Ah, O Grande Livro da Criança do Brazelton, leitura obrigatória e essencial, comprei-o tarde, mas tem valido a pena.

  4. Celia says:

    Boa sorte e tudo bom para vocês! Vais ser uma super mãe, pelo menos já fizeste algo incrivel que é ter arranjado tempo para escrever nesta altura da tua vida! Parabéns!

  5. Dee, muitos parabéns, fiquei muito emocionada e muito feliz com a chegada de seu Tiago.
    Já passei por isso duas vezes e, apesar de terem passados apenas 16 e 14 anos tem horas que parecem séculos e horas que parecem que foi ontem que vi minhas menininhas lindas chegando aos meus braços.
    Tenho certeza que agora as felicidades serão sempre multiplicadas, pois cada gesto novo do bebê é uma grande novidade e sempre festa.
    De coração desejo a vcs três uma linda caminhada repleta de felicidades!
    Um grande beijo a todos os três 🙂

  6. Alex says:

    Dee,
    Apesar de já term passado 11 anos desde o nascimento da minha 1ª filha, a Catarina, o seu relato foi inteiramente familiar. Ela nasceu na maternidade Alfredo da Costa e, apesar da felicidade imensa que constituiu o seu nascimento, a estadia na maternidade foi terrível. Sentia-me numa prisão e revi-me em tudo aquilo que relatou.
    Fiquei tão revoltada com a forma como fui tratada que deixei uma queixa na caixa de reclamações da qual não obtive resposta. Como a revolta persistia, apesar da felicidade de estarmos os 3 em casa e de ser mãe, enviei uma carta para a revista Pais e Filhos. depois de publicada, fui finalmente contactada pela maternidade, cujos responsáveis se mostraram muito ofendidos…
    Não quis repetir a experiência e, 4 anos depois, nasceu a Ana no Hospital da Cruz Vermelha, particular mas comparticipado pelo serviço onde trabalho. A experiência foi radicalmente doferente. Só tenho recordações boas, belíssimas. As da primeira experiência têm um gosto agro-doce…
    Beijinhos e desejos de felicidades.
    Vai correr tudo bem, embora a vida mude radicalmente… mas as minhas filhas são o melhor da minha vida…

  7. joão says:

    Tenho 19 anos e infelizmente já sei o que é esta grande dor. Com o objectivo de tentar ajudar-me e ajudar toda a gente que sofre com esta doença criei um blog, que pode ser usado como o nosso cantinho, uma vez que grande parte das pessoas não nos compreende..desabafem, tudo é importante, podemos aprender muito uns com os outros!
    http://ocantinhodosdeprimidos.blogspot.com/

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