Birras

Não sei se é uma reação tardia à  irmã mas as birras do Tiago têm vindo a tornar-se outra vez mais frequentes e cada vez mais manà­acas. É um bocado difà­cil explicar uma birra do Tiago a quem nunca viu uma mas é mais ou menos assim: começa com algo normal como recusar-se a tomar banho ou, como foi o caso de hoje, resolver começar a tirar as calças no meio da rua. Digo-lhe que não pode e ele insiste.

Hoje foi no caminho entre a escola e casa. Tentei explicar que não se podia despir na rua e ele começa a rabujar, com as mãos a puxar as calças para baixo. Por esta altura deixa de falar e por mais que pergunte o que se passa, porque é que está a fazer aquilo, etc, ele não responde com uma única palavra. Acabei por pegar nele ao colo e começar a dirigir-me para casa mais rapidamente porque já sabia como aquilo ia acabar. Ele luta para se soltar mas recusa-se a andar sozinho quando o pouso, começa a dizer ‘não, não, não’ repetidamente mas não responde quando pergunto ‘não o quê?’.

Acabei por ter de lhe agarrar no braço e continuar a andar e o ‘não’ passa a ‘não quero, não quero, não quero!’,  ‘Pára pára pára!’ e finalmente ‘pára com isso!’ o mais alto que consegue, acompanhado de um choro convulsivo e berraria ao mais alto nà­vel. Eu até aqui não fiz nada a não ser tentar falar com ele e quando não funciona, continuar a andar em direcção a casa. O que vale é que não me preocupo muito com o que as outras pessoas pensam porque senão imegino que a situação seria mais complicada ainda, com a quantidade de gente que fica especada a olhar e a comentar.

Durante todo este tempo tenho um medo imenso que ele consiga soltar-se e comece a fugir porque estou também a ter que empurrar o carrinho com a Joana e não posso simplesmente largar a bebé para correr atrás do tarado.

Quando consegui finalmente chegar a casa, depois de ter que transportar tanto o carrinho como o Tiago pelas escadas acima, já estava nos limites da sanidade mental e paciencia pelo que a criança levou umas palmadas e ficou fechado no quarto até eu me acalmar. Liguei ao Pedro para ter a certeza que não ia torturar a criança, algo que a certo ponto começa a apetecer, e quando tive a certeza que já estava calma e ele tinha finalmente parado de berrar (depois de começar a chamar pelo pai porque a mãe estava a ser má, claro) fui ao quarto falar com ele. Perguntei porque é que tinha feito aquela birra e a resposta foi que as calças estavam sujas. Já tinha reparado que ele tem um comportamento um bocado extremo – quando cai um pingo de comida ou là­quido na roupa tem de se despir imediatamente – mas no meio da rua nunca tinha acontecido. Tentei explicar que as pessoas não podem andar sem roupa na rua e que ele tem de aprender a respeitar as regras mas ele ignora-me completamente. Acabei por lhe tirar os brinquedos que ele estava a usar como distração para me ignorar e voltei a sair.

Quando voltei passados uns minutos voltei à  carga e ele acabou por ‘dizer’ que percebia que se tinha portado mal e que não voltava a fazer. O ‘dizer’ está entre aspas porque se limitou a uma comunicação não verbal com abanões de cabeça. Mesmo assim recusou-se a pedir desculpa e ficou no quarto mais um bocado. Depois saiu para o hall onde encontrou uma esponja. Veio perguntar se podia brincar com a esponja e eu disse que sim mas aproveitei para lembrar que não tinha ainda pedido desculpa pelo seu comportamento e ele lá o fez, o mais baixinho que conseguiu. Depois agarrou na esponja e foi lavar o chão da cozinha – voluntariamente, entenda-se – e passou a birra finalmente. Tinham passado quase duas horas.

A única coisa que posso dizer é que espero que passe porque odeio sentir que estou em guerra com o meu filho de 4 anos e que ele parece estar a ganhar.

10 thoughts on “Birras”

  1. Nem me atrevo a opinar… acho que só mesmo quem passa por elas. As birras do meu filho ainda são muito limitadas (17 meses). A única experiência que tenho de birras feias é com a minha afilhada, mas a visão de quem está “de fora! é sempre diferente da visão dos pais. Se ficasse só comigo era um anjo, na presença da mãe, teve uma fase entre os 4 e os 6 anos em que se transformava no diabo em figura de gente. Felizmente [e a muito custo] acalmou e hoje tem 11 anos e é uma miúda porreira. Só posso desejar que esta fase do Tiago seja apenas isso, uma fase. E que passe rapidamente. Com a minha falta de paciência, acho que já me tinha saltado a tampa :\

  2. Olá

    A muitos anos que te sigo religiosamente. Quase todos os dias te leio.
    Não vos conheço, mas são quase da família 🙂 e sinceramente acho que és uma grande mulher.

    Desculpa-me a ousadia, mas ao ler este post não pude deixar de comentar. Não me leves a mal, nem me interpretes mal, mas o teu filho só faz birra porque tu estás em conflito interior.

    És tu quem se sente culpada de cada vez que deixas o Tiago no colégio e ficas com a Joana.

    As crianças sentem tudo o que os pais sentem e principalmente o que a mãe sente. Relaxa e pára de te culpares. Digo-te isto por experiencia, não porque tenha filhos, pois infelizmente ainda não os consegui ter, mas porque já vi isto acontecer a muita gente.

    Um beijinho grande e não estás em guerra com o teu filho, estás em guerra contigo, relaxa e simplesmente aceita (“,)

    CG

  3. Carla, não levo a mal mas parece-me estranho ter alguém que não me conhece presumir que sabe como é que eu me sinto.

    Não tenho qualquer sentimento de culpa em relação a ter o Tiago na escola. Se estivesse em casa o tempo todo ele dava comigo em doida e eu passava a vida a ralhar com ele por isso é melhor assim. Acho que a escola lhe fez bem, que o tornou menos introvertido e combate a sua tendência natural para se isolar, algo que considero importante.

    A Joana está em casa porque achei que era justo dar-lhe o mesmo que dei ao Tiago – um ano da minha atenção exclusiva – mas devo dizer que me está a custar e já conto os dias até ela ir para a escola também. Antes dela nascer estava a tentar construir um negócio que foi basicamente por água abaixo graças à falta de tempo que tenho agora e isso custa-me bastante.

    Já aceitei que tenho um filho com um lado muito meigo e outro muito difícil e estou apenas a tentar perceber como lidar com isso de forma a não ficarmos a odiar-nos mutuamente para o resto da vida.

    O meu filho é um ser independente, com vontade e personalidade próprias e não posso controlar o seu comportamento ou sentimentos. Achar que esse comportamento é apenas uma projecção do meu insconsciente seria altamente arrogante e estaria a tentar retirar-lhe a sua autonomia e identidade.

  4. Costumo ler-te, mas raramente comento, mas quando vejo alguns comentarios confesso que há pessoas que tiram-me mesmo do sério 😛
    Não deves ter grande paciencia para este género de conversa mas, a verdade, é que os miudos fazem birras. Podem ser testes de paciencia, pode ser mau feitio, pode ser a unica forma de darem largas à sua personalidade, pode ser só porque sim… a verdade é que fazem birras, sempre fizeram, põem a cabeça dos pais em água e levam os pais (às vezes) à loucura, mas para além dos efeitos nos pais, não consigo acreditar que isso seja um sinal de nada de especial. Acredita que passa. E tenho a certeza que o tiago vai ser um miudo, um adolescente e um adulto impecavel 🙂

  5. Nada melhor que sentido de humor para estas situações em que só nos apetece partir-lhes a cara! Já experimentaste bater palmas e dizer “boa! mais alto!” ou então o “time out” aqui em casa resulta e foi conselho da pediatra (tem 3 filhos), que é ficarem num canto/quarto sem público até se acalmarem… a Rita vai para lá esperneia grita e depois cala-se e vem ter connosco “Já tás melhor?” “sim :-)”

  6. Peco desculpa pelo meu comentário, não era minha intenção ofender-te, ou querer ser dona da razão, quem sou eu para o fazer, não passou de uma opinião duma tua leitora que talvez ignorantemente te sente já como amiga.

    Partilho da tua opinião de que as crianças devem ir para o colégio e se puderem ter a Mae por perto nos primeiros tempos de vida, óptimo, mas mais uma vês e’ a minha opinião.

    Continuação do excelente trabalho que tens feito como mulher, Mae e ser humano.

    Beijinho e fica bem

  7. Dee, se te serve de consolo, há mais como tu…eu já deixei de procurar razões freudianas, sendo que aguento com os comentários públicos de que a culpa é toda minha (e sempre) das birras monumentais do meu junior (3 anos e meio). A realidade é simples: como tu, sou uma mulher muito racional, casada com um homem igualmente racional. Não há cá misticismos. Os putos são assim de feitio (afinal de contas não nasceram da cegonha…) e de educação. A tentar não dar uma lambada à primeira, acabamos por lhes dar espaço. A escolha é nossa e é a melhor. Grelha-nos a paciência. Pois é. Mas é a maneira que temos de os fazer adultos responsáveis a seguir. O meu não tem tido uma vida fácil. Em três anos e meio mudou de país três vezes. Tem irmãos que tão depressa vivem connosco como desaparecem. Há que lhe dar um certo desconto sem deixar a coisa chegar a extremos. Quanto a castigos, há gente que quebra, há outros que nem por isso. O meu filho vai ser um adulto tramado. Se hoje em dia não quebra nem com a retirada dos brinquedos favoritos, quando for adulto não vai quebrar nem por mais uma. Talvez (tenho esperança) seja um Ser Humano às direitas. A defender os seus princípios (os que ensinamos) a todo o custo. beijos e continuem!

  8. as birras são completamente aleatórias … o meu sobrinho mais velho foi uma criança super doce e nunca fazia cenas até que um belo dia aprendeu a estupenda expressão ‘mas tem de ser’ e a partir daí tem havido momentos que levaram os pais, os avós e aqui a tia a considerar trancá-lo num quarto até ter 18 anos!

    quando nasceu o andré, o primeiro mês foi uma dose, acalmou, e quando o andré começou a ser mais activo a piada desapareceu porque de repente ele entrava à força no espaço dele, tem havido momentos daqueles bem dose e a minha cunhada tem momentos em que agarrou no casaco e saíu porta fora e deixou-os com o pai porque já não aguentava mais, a mais recente é querer ir almoçar todos os dias a casa da escola só para confirmar que o irmão está no infantário e não em casa a desfrutar da mãe!

    a minha cunhada fez o mesmo que tu, eles estiveram basicamente um ano e tal em casa com ela … são crianças radicalmente diferentes mas ambas muito teimosas!

    as birras são aleatórias e o diogo consegue entrar num loop que não lembra a ninguém e só diz mas tem de ser, e tem de ser, faz o mesmo jogo do tentar manipular a situação a tentar meter os adultos uns contra os outros. as desculpas também são extraídas a ferros. outras vezes tudo é fácil e corre bem, sempre teve de haver mais diálogo porque ordens directas com aquele miúdo não funcionam muito bem.

    não há manual nem conselhos, cada criança é diferente, tu só podes saber que tens razão, que tens de navegar estas águas o melhor possível e infelizmente não podes ceder em certas coisas porque senão a coisa só vai escalar e piorar…e que não é pessoal, tu és apenas a pessoa que por acaso lá está e leva com a coisa. magoa-se sempre mais os mais próximos infelizmente. o diogo era um anjo no infantário e em casa era tipo quem és tu, romeiro?! é o que tu dizes, são miúdos com 2 lados que são quase extremos opostos.

    Mas mói e muito, tem calma e tenta arranjar um tempo para ti para regroup, refocus, recenter. this too shall pass.

    força, muita, muita força!!!

    beijos cósmicos, ana

    ps – eles são adeptos do timeout, mas a partir de uma certa idade já não funciona, e tem de ser com perda de priviilégios … se sairem do sítio, a duração do timeout duplica, e vai duplicando, é um minuto por cada ano, o diogo à conta de se levantar passou n tempo no timeout até que deixou de se levantar porque lhe bateu que a coisa durava muito mais, agora é mais eficaz perda de privilégios, mas tirar-lhe os brinquedos quando os do irmão estão à mão não é fácil…é ir experimentando…

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